Edson
Lustosa
Por
recomendação de uma colega jornalista, achei de me “reinventar”
nessa coisa de notinhas curtas para internet. Lancei-me então na
proposta da coluna – mais proposta do que coluna – Tristes
Tópicos. Puro experimentalismo de resultado. Pra ver o que dá.
Dez
notas de três linhas e meia… e correr pro abraço! Ou pro
embaraço. Textos curtos não encurtam minha língua. Assim como não
ter o hábito de morder – uma sinecurazinha daqui, outra dacolá –
não me faz menos mordaz. Síntese: mordo a língua vez por
outra.
Inaugurando
a tal coluna Tristes Tópicos, enviei o texto para alguns sites de
amigos meus. Gente amiga mesmo, que já demonstrou solidariedade em
momentos difíceis. Gente com quem sei que posso contar em situações
menos perigosas que publicar meus textos.
Compreendi
perfeitamente a decisão dos colegas e, se já me entregara de corpo
à internet, acabei por fazê-lo também de alma. Publiquei meu texto
na página Opinião Rondônia, do Facebook; no meu próprio blog, no
blog Viva Rondônia; e compartilhei a postagem com amigos.
Enviei
também, mas a essa altura já me sentindo fora do circuito e sem
esperança de publicação, para o site Gente de Opinião. A
receptividade se materializou no tratamento visual: ganhei chamada na
página inicial com fotografia e tudo. Até melhorei da depressão.
Senti-me,
por assim dizer, “reabilitado”. A fotografia usada pelo site
contribuía para isso. Um dos não poucos momentos felizes do colega
jornalista Aldrin Taborda – e meu, certamente – que, numa festa
de formatura, registrou-me numa ameaça de sorriso. É minha “foto
oficial”.
Nos
tempos do A Tribuna, com o suplemento semanal Papiro, nos tempos do O
Guaporé, com a coluna diária Geleia Geral (marca que depois veria
aproveitada por colegas em outros jornais), era sempre aquela reação
do “dia seguinte”: os comentários, as críticas… censuras
também.
Na
internet as reações são imediatas. Umas, mais estouradas; outras,
mais respeitosas. E, neste segundo grupo, o convite à reflexão que
recentemente me foi feito pelo velho (nos dois sentidos da palavra,
como ele mesmo enfatiza) amigo Amadeu Machado.
Dr.
Amadeu me fez refletir sobre a interpretação que poderia ser dada a
uma nota que integra a coluna Tristes Tópicos de 20 de novembro,
anteontem. Na verdade duas notas seguidas. Não para reiterá-las,
mas para sarjar a inflamação, reproduzo-as aqui:
SUPERSECRETÁRIO
– Pelos nomes que vêm
sendo lançados como prováveis secretários da administração que
se iniciará em 1o
de janeiro próximo,
em Porto Velho, sob a batuta do empresário Hildon Chaves, deduz-se
que Antônio Ocampo será uma espécie de supersecretário.
Afinal, é o único museólogo na lista.
UNIVERSITÁRIOS
– Tomando-se como verdadeiras essas especulações que vêm sendo
lançadas na mídia até mesmo por colaboradores próximos do
prefeito eleito Hildon Chaves, chega-se a supor que, tendo ele
buscado ajuda dos universitários, errou a porta do curso de
administração e entrou no de arqueologia.
Pode
rir, leitor. Se lhe apraz. Afinal de contas, mesmo tendo no meu
currículo a passagem pela coordenação de comunicação social do
sisudo Tribunal de Justiça, nunca consegui me desprender dessa
ironia que, lá atrás, anos 80, me abriu as portas do saudoso
Pasquim.
Mas
é exatamente aí que mora o perigo: a ironia. Um educador, Professor
Nazareno,
que publica habitualmente artigos nos sites porto-velhenses, tratou
de forma escancarada
a questão: “Hildon Chaves do PSDB, já escolheu o seu “novo”
staff para administrar...”.
E
prossegue: “...pelos próximos quatro anos a pior capital do Brasil
em qualidade de vida, chega-se à triste conclusão de que esta
fedida cidade é mesmo uma dádiva de Deus ao contrário e que não
restam dúvidas de que Satanás é mesmo o seu protetor maior.”
A
apoteose: “O “Gabinete
Naftalina”
ou “Museu
dos Espantalhos”
(...) traz uma relação sinistra de nomes velhos e conhecidos da
política e da administração local que, em tese, são também
corresponsáveis pelo estado de penúria em que se encontra a
capital.”
E
justifica seu raciocínio com um argumento no mínimo plausível,
ainda que genérico: “Porto Velho não se transformou de uma hora
para outra na latrina que é: foram anos de descaso, péssimas
administrações e incompetência que nos transformaram nesta
favela.”
Tal
diferença de estilo, entretanto, não
me faz sentir-me menos culpado. Nas aulas de direito penal, com o
mestre Dimas da Fonseca, na UNIR, aprendi que, quando o autor usa
ardilosamente de sutilezas e malabarismos frasais, maior deve ser a
pena, se condenado por ofensa à honra.
Os
doutrinadores justificam que assim deve ser porque o indivíduo se
entregou mais à prática do delito. Entendo que, se o desbocamento
não é fortuito, mas contumaz, também se evidencia a determinação
em cometer o delito. Mas isso é apenas uma digressão.
Voltando
aos Tristes Tópicos: depois do texto do Nazareno, passo
a refletir já não no que escrevi (redação), mas no porquê de o
ter escrito (motivação). O que pode ter-me incomodado nos nomes
especulados para compor o secretariado de Hildon Chaves?
A
velhice? Alguma espécie de “gerontofobia”? Ora, mas quando ainda
nem se admitia que fosse Hildon o candidato do PSDB e os nomes de
possíveis candidatos a prefeito incluíam diversas opções que nem
se concretizaram, descaradamente demonstrei meu apreço por Odacir
Soares.
Em
artigo intitulado “Quem quer ser prefeito de Porto Velho?”, fiz a
Odacir mais reconhecimentos que críticas. E ressaltei sua
experiência. Logo, não seria a idade, propriamente, o que me
inclinaria a um pensamento mais crítico ao suposto secretariado de
Hildon.
Então,
o que foi? Percebo que a resposta que
melhor
se desenha é a tipicidade dos perfis: partícipes de gestões
pretéritas. Daí a alusão ao passado, à arqueologia, à
museologia. E não à naftalina, a que faz menção o professor
Nazareno no
texto que fez publicar.
E
a
tipicidade dos perfis não apenas pelos perfis, mas pela própria
tipicidade: se Hildon pretende reduzir o número de secretarias para
dez, por que reservaria mais que a metade para a velha guarda? Que
intenções, ou pretensões, poderiam estar escondidas aí?
Pois
bem: certamente o prezado leitor já deve ter visto nos templos de
algumas igrejas recém-inventadas uma bandeira de Israel. Por
que ela está ali? Por que é a forma de se
sentirem
mais realistas que o rei. Mais vinculados ao compromisso bíblico que
a Igreja Católica.
As
igrejas evangélicas mais tradicionais não incorrem nessa
papagaiada. Já têm sua tradição de
alguma forma consolidada, ainda que bem menor que a da Igreja
Católica. Mas as recém-criadas sentem uma enorme necessidade de
demonstrar raízes bíblicas.
Aliás,
tal compulsão as leva a uma excessiva ênfase na fundamentação
veterotestamentária. É muito Moisés e José do Egito pra pouco
Jesus Cristo e demais personagens da nova e eterna aliança que
povoam os Evangelhos, Atos e epístolas.
Faça-se
agora uma compressão cronológica para caber na história política
de Porto Velho. Será que Hildon – em sendo verdadeiras tais
especulações quanto a seu secretariado – não estaria buscando
esse enraizamento para superar um certo complexo de migrante da
última safra ?
Se
é isso, então não estaria propriamente prestigiando, como forma de
reconhecimento, o mérito dos nomes especulados. Mas, em verdade,
tomando-lhes emprestado o prestígio. Aquelas coisas que às vezes
são sopradas por conselheiros que se aproximam depois do resultado
das urnas.
Se
o prezado leitor chegou a essa altura deste texto é porque muito
provavelmente não constitui a grande massa dos que têm pressa e
leem notinhas como quem se alimenta de pílulas. Pois bem, vejam que
diferença faz podermos nos estender em uma análise.
Destarte,
uma vez esclarecido que, em nenhum momento, minha ironia se voltava
às pessoas que tiveram seus nomes especulados como prováveis
secretários, mas, sim, ao fato político a que tais especulações
se referem, creio que já posso ir dormir. Não o faria sem tal
providência.
Como
última observação, sugiro ao novo prefeito que, se – e somente
se – for verdadeira sua intenção de reforçar-se
administrativamente com a experiência de homens do quilate dos que
foram especulados, inspire-se na iniciativa de seu correligionário
João Dória.
Homem
de gestão, Dória inova a política paulistana anunciando a criação
de um conselho que reunirá os ex-prefeitos. A octogenária Luíza
Erundina, do auge de suas convicções trotskistas, foi a primeira a
aplaudir a iniciativa, reconhecendo o mérito do tucano.
Digo
“inspirar-se” e não “copiar”. No caso, Hildon poderia reunir
em um Conselho Municipal de Gestão não apenas ex-prefeitos (aliás,
alguns devem ser até evitados), mas homens (e mulheres) que reúnam
experiências exitosas de gestão pública. Gente
do bem.
Sinceramente
entendo que confinar um Tião Valadares ou um José Vitachi em uma
secretaria específica, com atribuições mais operacionais ou
táticas que estratégicas, seria um desperdício de capital humano
muito grande. Algo impróprio do que Hildon
prometeu
ao povo.
Ao
velho amigo Dr. Amadeu Machado – inexoravelmente cada vez mais
velho e providencialmente cada vez mais amigo – meu agradecimento
sincero. E que sua atitude de questionamento sirva de exemplo e
estímulo a outros que se deparem com as letras que junto em frases.
Agradeço
a todos os amigos que prestigiam o que escrevo. De todas as minhas
compulsões, escrever
certamente é a mais social. E parabenizo o colega Gessy Taborda,
pioneiro do webjornalismo em Rondônia, pela iniciativa do grupo
Informação sem Censura: um motivo a mais para acessar o Facebook.
Ah,
sim… o título, né? É minha homenagem a Clarice Lispector, que
afirmava ela mesma não conseguir entender o que tencionava dizer com
seu conto O Ovo. O velho a gente conhece. O ovo está sempre por vir.
À
cama agora, porque serotonina é fundamental.
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